Comemorar 100 anos de Eugénio de Andrade

No ano do seu centenário, a poesia de um grande, senão o maior, poeta que o Porto conheceu – José Fontinhas, pseudónimo Eugénio de Andrade.

 

Tenho o nome duma flor

quando me chamas.

Quando me tocas,

nem eu sei

se sou água, rapariga,

ou algum pomar que atravessei.

 

Os amantes sem dinheiro 

Tinham o rosto aberto a quem passava.

Tinham lendas e mitos

e frio no coração.

Tinham jardins onde a lua passeava

de mãos dadas com a água

e um anjo de pedra por irmão.

Tinham como toda a gente

o milagre de cada dia

escorrendo pelos telhados;

e olhos de oiro

onde ardiam

os sonhos mais tresmalhados.

Tinham fome e sede, como os bichos

e silêncio

à roda dos seus passos.

Mas a cada gesto que faziam

um pássaro nascia dos seus dedos

e deslumbrado penetrava nos espaços.

 

— Etelvina S. Ferreira

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