Reflexão sobre Erasmus

– Maria José Moura de Castro

“A primeira fase do saber é amar os seus professores.” –  Erasmus de Roterdão

Erasmus de Roterdão (1466-1536) foi um humanista, teólogo e filósofo de origem holandesa, além de um dos maiores pensadores da era renascentista. Abriu caminho e fez progresso. Trabalhou pela liberdade dos indivíduos. Os seus ditados ainda são válidos e tiveram uma larga difusão no seu tempo. Defendeu a educação baseada no pensamento livre. O ensino devia ser dado com amor e paciência, o crescimento humano feito por meio da troca de ideias. Expandiu o conhecimento e o desenvolvimento do ser humano.

Erasmus de Roterdão serve de ícone ao Programa Erasmus que promove a aprendizagem e compreensão entre os povos. É um tempo para aprender e socializar, é um programa que combina todos os atuais planos da UE para educação, formação, juventude e desporto, e que iniciou em janeiro de 2014.

A existência deste tipo de investimento profissional é uma mais-valia e prática a preservar, motivo, inclusivamente, de motivação para um professor. Tive a felicidade, primeiro, de estar numa escola que aderiu ao programa Erasmus+, através do projeto “A 2nd step forward”, a Escola Básica 2/3 Júlio Dinis, em Gondomar; segundo, de me candidatar à mobilidade Job Shadowing, no Liceo Statale Alfano I, em Salerno, Itália, uma escola aberta a todos (“La scuola aperta a tutti”), e de ser aceite.

Itália: precisamente o país onde Erasmus de Roterdão viveu três anos; um país ao qual associo mentes brilhantes e que apetece conhecer, para nos imbuirmos desse espírito de partilha.

Assim, no presente ano letivo, 2022/2023, entre 26 de fevereiro e 9 de março, parti com quatro colegas, Paulo Pinto, Felismina Nunes, Madalena Nogueira e Marta Santos, que passei a conhecer muito melhor, quer pessoal, quer profissionalmente. Tenho orgulho de dizer que formámos uma ótima equipa de trabalho, cujo chip de raciocínio teve de se adaptar a várias línguas, entre as quais o italiano, o inglês e o próprio português.

Fomos cheios de entusiasmo e com algumas expectativas, nomeadamente, observar como os professores italianos motivavam os seus alunos, resolviam questões comportamentais ou questões relativas aos alunos com NEE.

Levámos de nós e recebemos deles, dentro do tempo e das oportunidades que foram criadas, bastantes, por sinal. Procurámos seguir o lema de aproveitar ao máximo, mesmo em termos de roteiro cultural, pelas terras próximas de Salerno (Amalfi, Vietri, Paestum, Castelo Arechi, Nápoles, Pompeia, Baronissi e a sua Casa da Poesia, Cava di Tirreni, e Pontecagnano) e pela sua gastronomia. Tudo fez parte.

Os italianos são um povo muito simpático e hospitaleiro, pelo que nos fizeram sentir em casa. A equipa docente e discente abriu-nos as portas afavelmente. Logo no primeiro dia, fomos recebidos pela nossa tutora, a professora Pandozzi, e pela Diretora Barone, à qual ofertamos, orgulhosamente, em nome do presidente António Braz, uma lembrança típica da Junta de Freguesia de S. Cosme, Valbom e Jovim: a representação do coração de filigrana da nossa cidade.

Ao longo dos dias que vivenciámos, cumprimos com um horário – base, durante o qual estivemos divididos em grupos variáveis, e pudemos assistir a aulas, de alunos com idades compreendidas entre os 13 e os 18 anos, desde aulas de Inglês, História, “Subtitle Class” (consistindo na produção de vídeos em que se alia poesia contemporânea à dança e música, também oferta desta escola), Matemática, Química, Filosofia e Italiano. Percorremos a parte central do Liceo e a sua sucursal, dado que foi necessária uma extensão para os mais de 1300 alunos que abrange, nomeadamente alunos de outras nacionalidades.

Um dos espaços que fizemos questão de explorar foi a sua biblioteca, que neste caso ficou aquém das nossas expectativas. É um espaço que também funciona como auditório, ao fundo do qual constam poucos livros, revistas e filmes, sem a presença fixa de um docente, ou seja, pouco dinamizada/habitada. Contudo, ficámos contentes por aí encontrar “O ano da morte de Ricardo Reis”, de Saramago. Assim como nos honrou, encontrar livros com poesia de Eugénio de Andrade e Fernando Pessoa na “Casa da Poesia”, que nos foi dada a conhecer e onde passámos momentos poéticos.

O que mais nos fascinou, no conjunto, foi o poder de argumentação dos alunos, a componente artística existente, o leque de línguas que podem aprender, a preocupação com temas atuais, a importância dada aos poetas vivos, o recurso a uma professora de inglês de origem, e a presença de professores da Educação Especial, sempre que necessário.

Surpreendeu-nos o facto de os alunos terem 13 anos de ensino, sendo que o último ano corresponde a uma espécie de estágio na vertente que pretendem seguir; e não terem intervalos, podendo comer e beber na sala, embora só tenham aulas até às 14h, incluindo o sábado. A parte da tarde é reservada para quem pretende aprender um instrumento ou dança.

Constatámos que partilhamos preocupações, não temos receitas, mas vontade de aprender e progredir uns com os outros; que nos movemos por amor à educação dos nossos alunos, que, convém dizer, não deixaram de ter as suas aulas, por causa da nossa mobilidade, uma vez que estas foram repostas ou permutadas.

Esta mobilidade aumentou-nos como pessoas e profissionais. Foi uma bela imersão bem como a oportunidade de levarmos um pouco da nossa cultura. Certamente que, agora, quando os professores/alunos italianos falarem dos portugueses, vão ter como referência, não apenas, o Cristiano Ronaldo, mas também alguns dos nossos poetas que divulgámos, um pouco do nosso ensino, da nossa história e da nossa língua.

De qualquer forma, há fortes probabilidades de um trabalho futuro conjunto, pois estamos e estaremos em contacto. Por agora, recomendamos e disseminamos, nomeadamente junto dos nossos colegas/alunos curiosos por novidades.

Aliás, já disseminei um pouco desta mobilidade na USG, na disciplina de “Encontros com a Literatura”, dando a conhecer “A Casa da Poesia” e um poeta que faz parte da sua história: Jack Hirschman.

Por último, e citando Airton Ortiz: “Somos o resultado dos livros que lemos, das viagens que fazemos e das pessoas que amamos”. Neste momento, digamos que aumentei de tamanho (não foi apenas a minha bagagem): sou uma pessoa com mais livros, viagens e gente dentro. Engrandeci. Nomes como Luigi Odici, um aluno de 18 anos, com ótimo domínio de Inglês, certificado, e aberto à cultura portuguesa (tanto que até enfiou o chapéu de Portugal); e Rosana Vertucci, professora de origem canadiana, mas feliz e integrada em Itália, aguçaram, por exemplo, a minha curiosidade para a leitura de Luigi Pirandello e Maram Al-Masri, respetivamente.

Bem hajam.

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