– Rui Brito da Fonseca
As abóboras e as mães aboboreiras, sempre me fascinaram. Logo o seu nome no domínio botânico: cucurbitáceas. Com esta designação, tinham de ser especiais e prender a minha atenção. A semente da qual nascem tem forma e tamanhos variados e espantam que dali irá sair algo grande e diferente…
Deitada à terra fofa, estrumada e húmida, ao fim de meia dúzia de dias perfura-a, despontando, durante a noite sem ninguém ver, em dois cotilédones, que se vão separar em rijas, ainda que pequenas, folhinhas. A partir daí, havendo calor, luz e água, a plantinha cresce, cresce… sem pedir licença, com folhas largas, estendendo-se em trepadeira que tudo encobre, pelo solo ou subindo em ramada. E então começa o verdadeiro fascínio…
O mar verde é pontuado de floridos pontos amarelos, que murcham em poucos dias. As flores femininas trazem apenso um minifruto que, fecundadas, se vão emprenhando e ganhando volume. Nesta fase, normalmente desaparecem aos olhos dos humanos, certamente escondidas pela mais luxuriante folhagem que não pára de expandir. O hortelão voyeur, contudo, teima em espreitá-las sem elas darem conta, pois sentindo-se espiadas, podem envergonhar-se, definharem e até morrerem; por outro lado, dá gosto ao espreitador vê-las desenvolver a partir de configurações quase infantis, ganhando formas jovens e adultas. Esta evolução é relativamente rápida, mas não deixa de se revestir de uma certa magia e sensualidade, num crescimento e volume arrebatador, deliciando o mais conspícuo hortelão. A silhueta rubicunda, anafada e gulosa, é uma tentação sensitiva e, se tivermos a sorte de a encontrar húmida, rivaliza com a lisura de uma coxa de jovem égua. Aqui, entra o domínio de um inocente devaneio erótico, pois essas sensações visuais e tácteis podem produzir um bem estar, ainda que momentâneo. Imagino que o pintor Botero tenha sido um atento apreciador de inspiradoras abóboras!
Depois, para o casual visitante do aboboral, dar sem contar com um desses exemplares, faz-lhe soltar um oh de satisfação pelo pequeno prémio. Para mim, é um domínio que roça a felicidade dos sentidos descobrir, depois de escondida o tempo todo, e vê-la de repente surgir, numa voluptuosidade intensificada pela surpresa.
E é nos quentes Julhos, principalmente nas tardes dos domingos pasmaceirosos em que a Natureza pouco bule, que as abóboras, como lambonas, se espreguiçam num crescimento desenfreado, ganhando as tão sedutoras formas.
Lá para o fim do verão, já com as folhas murchas e amarelentas, são colhidas e, quando possível, dispostas como troféus de fartura nos telhados, ao já fraco soalheiro para as endurecer na casca, o que as conserva num vigor que chega a durar o ano inteiro, nunca abandonando o seu garbo – que se derramará em saborosas sopas e doces deliciosos.